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Já nem me conheço

segunda-feira, março 28, 2011

De uma memória tão antiga


dizer Dezembro como se o mar tocasse a voz

ou dizer uma rosa rubra atravessada

por lábios de luz.

dizer o oriente de uma estrela

e vestir a pele de um poema.

mas a palavra é uma criança tolhida de frio

nos cabelos nevrálgicos que a árvore segura.

e assim amanhecemos, tardios e ébrios

no carrossel que orquestra a cidade

com tambores de solidão.

dizer corpo e ser ponte sábia para o outro lado

e a vida ser tão simples como a mão

que toca a pele da sílaba

de uma memória tão antiga

como as solas de uma infância gasta.

dizer amor, esse fósforo que incendeia

e ser fogueira na nervura da palavra.

despir o olhar desta erosão de distância.

agasalhar os pés e resguardar

o dorso lírico do sangue

como se a um poema de Natal bastasse

o verde inflamado de um arbusto:

o labor inteiro do meu coração de terra.

Poema de Luísa Henriques

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